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Mostrando postagens de novembro, 2005

Comédia sobre um súbito ataque de gastrite nervosa.

Primeiro ato: pela segunda vez ele passa ao meu lado e finge não me conhecer. Contrariamente a outras ocasiões um comichão percorre toda a extensão da minha língua, materializando a vontade imensa de dizer "boa tarde". O mesmo comichão que certamente acentuaria o ponto de ironia no final da frase. Engulo o cumprimento como quem toma um remédio amargo e sigo o script, fingindo não conhecê-lo também. Horas depois, quando muito bem acomodada na cadeira do restaurante, chegaria à conclusão de que fora melhor assim. Tento me distrair com a conversa das minhas amigas. Elas falam trivialidades e tomam chopp; eu me limito a rir quando necessário. Dou-me o direito de ausentar da realidade neste exato instante. A presença dele me perturba. Não consigo pensar em outra coisa a não ser ir até sua mesa, enfiar o dedo em sua cara e perguntar "não vai falar nada não, babaca?". Como é que ele consegue ficar calado? Como consegue fingir que não aconteceu nada? Não, não é a prese

Quanta bobagem.

Plural. Foi assim que levantei hoje de manhã. Plural. Quieta, sorridente, empolgada, silenciosa. Sem voz, com sono, sem paciência, com dor. Absolutamente convicta de que o meu estado de espírito não afeta ninguém no mundo. E sem me importar caso afete. Posso ser e estar o que quiser. É fácil sair de casa, dar bom dia, tomar café, pegar ônibus. Difícil é ter o que falar. Ter quem te escute. Conviver. Há muito tempo não me sentia incomodada em ter de me misturar, sociabilizar. Mas o incômodo veio, mesclado a uma estranha sensação de estar fora do plano real. Como se estivesse envolta em camadas e camadas de bruma. Hoje não há voz para dizer o que for preciso. E não haverão ouvidos para escutar o desnecessário. É confortável abrigar-me sob o silêncio... Vou tomar sorvete sentada sobre a grama molhada.

Nostálgica.

Vê o vaso na janela? As flores estão murchando, e não há botões para uma nova florada. Meu pijama de bolinhas! A calça já não cabe, na blusa mais buracos que bolinhas. As bonecas estão dentro do armário, e os usinhos em cima da cama; meu cachorro é mais velho que eu...! Talvez não devesse gostar daquilo que há quinze anos eu gostava... (Amadurecer?) Mas kalanchoe ainda é minha flor predileta o pijama de bolinhas, o mais bonito os ursinhos, meus confidentes. Por quê abandonar as coisas que me são caras, as pessoas que me são caras? Cresço e levo as lembranças junto a mim. E roxo ainda é minha cor preferida. (Poema encontrado em um caderno velho; devo ter escrito no primeiro semestre de 2004.)

Luz dos olhos

Crianças são fabulosas. Como é que elas conseguem arrancar sorrisos largos e sinceros de mim tão facilmente? Basta ouvir barulho de criança e o sorriso vem a galope tomar minha boca, explorando toda a elasticidade do meu rosto. É irresistível. Há dois minutos atrás eu parecia uma menina de cinco anos de idade; uma moça (a Roberta) apareceu no meu trabalho com o filho de dez meses, o Vitor. Grandes bochechas, olhos espertos, manhoso até não poder mais. Quer coisa mais gostosa? Só carregando no colo pra melhorar. Sentamos os dois (eu e Vitor) na minha cadeira, em frente ao computador. Como todo menino pequeno, nada escapava a sua gana de querer pegar, bater, colocar na boca, jogar pro alto. Primeiro foi meu celular que quase morreu afogado; depois o teclado, que, não fossem as minhas intervenções, estaria semi estraçalhado. Coloquei o fone perto do seu ouvido - estava tocando Nando Reis - e, após ouvir a música por trinta segundos, lá foi o Vitor puxar o fio. Minhas tentativas para distr

Olhando de cima.

Quer o Otávio goste, quer não, resolvi colocar um poema dele no meu blog. Quem é Otávio? Um amigo meu que escreve bem pra caralh... Resolvi tirar folga de mim hoje. Mas divirtam-se com o poeminha abaixo, que, por sinal, é muito bom. E pra quem quiser ler mais coisas do Sr. Otávio Xavier: www.ruadoamendoim.cjb.net Té mais! Metades Vazio, cheio vazio. Repleto. Ausente. Completo. Carente. Vazio achei o vazio. O copo só está. O corpo também. (Otávio Xavier)

Entre uvas meio verdes e desejos já maduros.

Continuo ácida. Humor ácido, palavras ácidas, estômago ácido. Tomarei um anti-ácido ao chegar em casa? Não sei. Farei yoga na sala de piano? Não sei. Gritarei qualquer bobagem no ouvido do meu irmão só pelo prazer de incomodá-lo? ... Ocilo neste exato instante entre culpar ou não a humanidade pela minha acidez. Um amigo acabou de perguntar por quê sou triste no blog e feliz ao vivo. Não é isso. Não dá pra ser tão maniqueísta assim. Eu sou tanto uma coisa quanto a outra, mas no momento as coisas não têm sido fáceis para mim. O que não quer dizer que eu vá ficar chorando pelos cantos, contando minhas desventuras paras as paredes. Não vivo em função das minhas dores. E o resto do mundo não tem nada a ver com o que eu sinto ou deixo de sentir. Se eu estiver afim de falar, eu falo. Se você estiver afim de perguntar, pergunte. Mas voltando às uvas meio verdes... "Essa ferida, meu bem, às vezes não sara nunca às vezes sara amanhã."

Faça um favor a si mesmo: não leia isso.

Tire seu sorriso do caminho que eu quero passar com a minha dor. Ou seu piercing, caso você seja mais um "modernoso". Mas saia da frente. Veneno escorrendo lentamente. Estou quase me convencendo de que posso ficar mau humorada - geralmente eu não fico, só digo que fico. Vou tirar o dia para odiar tudo aquilo que efetivamente odeio. Odeio jiló. Odeio me olhar no espelho e perceber que engordei de novo. Odeio encontrar meus cds no quarto do meu irmão. Odeio quando preciso escrever trabalhos quilométricos e não consigo elaborar nem a "introdução". Odeio quando o telefone dá ocupado. Odeio quando meu celular começa a chiar. Odeio cólicas. Odeio ouvir minha mãe dizer "eu te avisei, Andrea". Odeio ver pessoas felizes na rua quando meu mundo está desabando. Odeio criar expectativas. Odeio ser ansiosa. Odeio quando eles não caem na minha chantagem emocional. Odeio pedir colo. Odeio acordar de manhã cedo. Odeio ressaca. Odeio quando não me escutam. Odeiam quando fi

Me encontrou tão desarmada que arranhou meu coração...

Mamãe mandou: "goste mais de você, menina." Ela disse isso há quatro horas atrás, e "isso" simplesmente não saiu da minha cabeça até agora. Não foi um "lave atrás da orelha", "vai arrumar a cama", ou "vai sair de novo?". Não foi conselho de mãe; foi conselho de pessoa vivida. Como doeu escutar aquilo! Não que eu tenha considerado ofensivo, não é isso. A questão é que bateu fundo, me fez olhar no espelho e constatar que eu tenho cuidado muito pouco de mim. Pela primeira vez eu percebi que minha alma está, assim como o meu corpo, repleta de cicatrizes. E pelo mesmo motivo: falta de atenção. Cicatrizes não são um sinal de vivência; são marcas de uma vida tocada com desleixo. Talvez a motivação da minha mãe tenha origens mais puritanas do que posso absorver mas, ainda assim, são válidas. Se entregar não é dar ao outro as rédeas dos seus sentimentos.

Derradeira estação.

Ao meu lado, um espaço vazio; dentro de mim, um coração invadido pelas lembranças. "Pior que a ausência do amor, a memória do amor". Quantas vezes mais essa frase se repetirá no interior dos meus pensamentos? Quê fazer quando o coração se cansa de tanto amar e desamar, preferindo se perder em dores antigas a recomeçar outra jornada? Parando para respirar. Estou de altas. Fechada para balanço. Em obras. Cuidado: cão bravo. Atenção: piso molhado. Perigo: alta voltagem. Este lado para cima.... Sem perder o humor e sem tirar o sorriso besta da cara, vou tocar minha vida tentando não tocar nas feridas -- urgh, rimou! Difícil foi, é e será. Isso não importa muito, na verdade. O importante é que o Banco Real dá 10 dias no cheque especial sem juros. Tá, pode rir! Pode mesmo, até eu estou rindo...! O relógio bateu meia-noite, a carruagem virou abóbora e os cavalos, ratos. Não perdi um sapatinho de cristal, nem um príncipe irá me salvar das garras da madrasta cruel. Mas estou voltando

Eu era assim...

Pequena, bochechuda e com cara de sapeca. Essa é a Deia versão 1987. De fraldinha de pano -- porque tinha alergia à fralda descartável -, pituca no cabelo e língua de fora. Quanta diferença pra Deia versão 2005! Sou agora uma mulher tagarela, pentelha, cheia de vícios. Nem sei qual é melhor. Mas às vezes eu queria retornar a minha fase "papinha". Eu dormia muito mais, comia mais, via mais televisão. E mamãe ainda contava historinhas pra mim! Ê vidão...

"Why does it always rain on me?"

SAPATO NOVO (Marcelo Camelo) Bem, como vai você? Levo assim calado de lá tudo que sonhei um dia como se a alegria recolhesse a mão pra não me alcançar Poderia até pensar que foi tudo sonho ponho meu sapato novo e vou passear sozinho como der eu vou até a beira besteira qualquer nem choro mais só levo a saudade morena é tudo que vale a pena *** Tem dia em que falta tudo; falta tempo, falta paciência, falta palavra... Cá estou eu num desses! Acho que o Fran Healy (vocalista do Travis - a frase do título é de uma música dele) e o Camelo podem dizer o que estou sentindo melhor que eu mesma. Outro dia eu escrevo... "Agora deixa eu dormir..."

Papai do céu me detesta.

Definitivamente. E não é pouco não. Ele me bate com uma mão e afaga com a outra. Isso não é postura de um "pai" que "ama" seus filhos. Quando eu penso que o dia não vai ficar pior, bingo!, lá vem ele me mostrar que, se ele quiser, pode sim. Mas não adianta! Pode mostrar seu poder, babacão. Não aceito hierarquias desde pequena, e não vai ser melando a minha vida que eu vou te obedecer. Nem fazendo dela um mar de rosas. Eu não obedeço é de jeito nenhum. Anda, junta as nuvens, junta! Faz chover, só porque vou ao centro da cidade hoje! Pode chover, eu não ligo. Eu chego em casa e tomo um banho quente, depois me enrolo em uma toalha e vou pra debaixo das cobertas.