Primeiro ato: pela segunda vez ele passa ao meu lado e finge não me conhecer. Contrariamente a outras ocasiões um comichão percorre toda a extensão da minha língua, materializando a vontade imensa de dizer "boa tarde". O mesmo comichão que certamente acentuaria o ponto de ironia no final da frase. Engulo o cumprimento como quem toma um remédio amargo e sigo o script, fingindo não conhecê-lo também. Horas depois, quando muito bem acomodada na cadeira do restaurante, chegaria à conclusão de que fora melhor assim. Tento me distrair com a conversa das minhas amigas. Elas falam trivialidades e tomam chopp; eu me limito a rir quando necessário. Dou-me o direito de ausentar da realidade neste exato instante. A presença dele me perturba. Não consigo pensar em outra coisa a não ser ir até sua mesa, enfiar o dedo em sua cara e perguntar "não vai falar nada não, babaca?". Como é que ele consegue ficar calado? Como consegue fingir que não aconteceu nada? Não, não é a prese