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Sobre mergulhos e invasões de domicílio

Eu falo muito. Falo alto, passando do grave ao agudo em uma mesma frase. Sempre tenho um assunto escondido na manga para quebrar a monotonia, o protocolo, a rigidez. Mas também gosto de ouvir; faço perguntas, incomodo, instigo meu interlocutor a falar. 

Ver o interlocutor falar. Como ele se expressa, se olha nos meus olhos, se mexe nos cabelos, se cruza os braços. A tensão nos ombros, o balançar de pés, o copo à frente, o corpo. Como ele trata o garçom, como se porta junto aos amigos. 

Pensar que nos expressamos somente através das palavras é sinal (ou seria um sintoma?) de uma imensa pobreza de percepção e sensibilidade. Os movimentos e tensões corporais, a escolha das palavras, a pronúncia, o tom que utilizamos são alguns dos incontáveis componentes da mensagem que pretendemos transmitir, conferindo sentidos que ultrapassam os verbetes do dicionário. 

Desvendar intenções em palavras que não foram ditas, desejos escondidos num olhar desviado, a reação após um leve roçar de braços... Como não se excitar com tantos e tantos mundos a serem invadidos e devorados?! Porque conhecer o outro através de sua expressão corporal é também comê-lo com os olhos, ouvidos, mãos, narinas. É entrar na casa sem pedir licença, abrir a geladeira e a gaveta de cuecas. É descobrir sutilezas, histórias e cicatrizes que nem sempre se desejou compartilhar mas estão à vista para quem tem o cuidado de observar. 
Se permita deixar as amarras do julgar guardadas no armário e desbravar esses milhares de pequenos universos que atravessam nossas vidas todos os dias! Olha, olhar, olhar até se fundir e confundir e voltar a ser você. Um você com um pouquinho de mim, do outro, do desconhecido mas, ainda assim, essencialmente você.

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